Mudanças na Jornada de Trabalho
Tiago Pavel, de 43 anos, é um exemplo de como as mudanças nas jornadas de trabalho estão alterando a vida profissional de muitos. Após iniciar sua carreira como bartender em um hotel de luxo em São Paulo, ele teve que deixar sua banda de rock devido à exigente jornada de trabalho de seis dias por semana e apenas uma folga. Agora, com a implementação da jornada 5×2 no Palácio Tangará, Pavel e outros 350 funcionários do hotel desfrutam de um novo modelo que prioriza a qualidade de vida e o bem-estar da equipe.
A iniciativa foi uma decisão da direção do Palácio Tangará, que acredita que a satisfação dos colaboradores é essencial para garantir um atendimento de excelência no setor de hospitalidade. De acordo com a especialista em futuro do trabalho, Maíra Blasi, a nova escala representa um avanço significativo: “Um único dia para cuidar da casa, da saúde ou da família é insuficiente. Saúde mental vai além de planos de saúde, envolve reduzir carga de trabalho e melhorar salários”, ressalta Blasi.
Impacto da Mudança
Com a nova jornada de trabalho, os colaboradores do Palácio Tangará agora têm um total de 104 folgas por ano, em contraste com as 65 da jornada anterior. Além disso, a carga horária semanal foi reduzida de 44 para 42 horas, permitindo uma melhor distribuição das horas trabalhadas ao longo da semana sem sobrecarregar o dia a dia. “Essa mudança não só atende ao desejo da maioria dos colaboradores, como também solidifica a posição do Palácio Tangará como um empregador de referência”, comenta Celso do Valle, gerente geral do hotel.
O que muitos não percebem é que, ao oferecer melhores condições de trabalho, as empresas também se beneficiam. Funcionários descansados e satisfeitos resultam em um atendimento de qualidade superior. “Estresse e cansaço inibem a paciência e a eficiência”, complementa Maíra.
Varejo Farmacêutico na Vanguarda
No setor farmacêutico, as Drogarias São Paulo e Pacheco, pertencentes ao Grupo DPSP, também adotaram o modelo de jornada 5×2. A empresa se tornou a primeira do segmento a implementar essa mudança, afetando cerca de 24 mil funcionários em todo o país, incluindo setores administrativos, lojas e centros de distribuição.
O objetivo é análogo ao do Palácio Tangará: proporcionar aos colaboradores uma melhor qualidade de vida. Para isso, a jornada diária foi ajustada para 8 horas e 48 minutos, aumentando o número de dias de descanso de 64 para 96 por ano. A rede destaca essa transição como parte de uma política mais ampla de valorização de seus funcionários, que já inclui benefícios como assistência médica, odontológica, participação nos lucros e programas de bem-estar.
Desafios e Tendências do Mercado
Essas mudanças não são meras boas ações por parte das empresas; são respostas a um mercado em transformação. Com a crescente concorrência de empregos em aplicativos, empresas tradicionais estão se desafiando a repensar suas políticas de trabalho. “Não é apenas uma questão de bondade; é uma estratégia de retenção de talentos”, afirma Maíra Blasi, observando como a realidade dos aplicativos de trabalho tem pressionado o setor.
Embora algumas empresas estejam na vanguarda da adoção da jornada 5×2, essa prática ainda não se consolidou amplamente no Brasil. O debate sobre a jornada de trabalho 6×1 encontra-se estagnado no Congresso Nacional, e o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva expressou a intenção de discutir novas formas de trabalho no país.
Expectativas para o Futuro
Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo e da União Geral dos Trabalhadores (UGT), acredita que a adoção da jornada 5×2 por algumas redes varejistas poderá pressionar a concorrência a seguir o mesmo caminho. “Esse é um passo que buscamos há bastante tempo”, afirma Patah.
Maíra Blasi menciona que, embora a jornada reduzida possa demorar a se popularizar, as empresas que realmente se preocupam em reter talentos provavelmente implementarão esse modelo nos próximos anos. “Existem preconceitos sobre a viabilidade desse modelo no Brasil, mas as experiências positivas podem moldar uma nova cultura”, conclui.
O CEO do Grupo DPSP, Marcos Colares, acredita que o novo modelo irá se tornar uma referência para o varejo farmacêutico. “Essa decisão é fruto de anos de pesquisa e reflexão”, afirma Colares.
A Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) optou por não se manifestar sobre o assunto no momento, aguardando os desdobramentos legais antes de posicionar-se sobre a questão. Por sua vez, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) afirmou que incentiva a busca de soluções por meio da negociação coletiva, destacando a importância de considerar as particularidades regionais dos diversos setores.